Cabeleireira crioula cria projeto social para ensinar cuidados básicos com o cabelo aos que mais precisam
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23 março 2023

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Há cerca de três anos a praiense Mitza Alfama criou o projeto Kuale Miniz, um salão de beleza especializado em cabelo crespos, cacheados, ondulados e naturais e desde então tem vindo a “quebrar tabus”, bem como a cuidar da autoestima dos cabo-verdianos. Recentemente, a jovem empresária criou um projeto social que visa ensinar os cuidados básicos com o cabelo.

É escuteira desde os 6 anos e o voluntariado sempre esteve presente na vida de Mitza Alfama. Há cerca de três anos abriu um salão de beleza especializado em cabelo natural e quis de alguma forma incorporar o lado social no negócio.

Ao longo desses anos a trabalhar na área, a cabeleireira constatou que a maioria dos cabo-verdianos ainda desconhece quais os cuidados básicos para o cabelo crespo, cacheado e ondulado. Preocupada com a saúde dos fios, em fevereiro deste ano, Mitza criou um projeto social para passar os seus conhecimentos às pessoas que não têm acesso a um salão de beleza.

“É um trabalho social que consiste num workshop com duração de 1h30 onde abordamos temas como a higienização do cabelo, o tratamento indicado para cada tipo de cabelo, bem como o que não deve ser feito porque muitas pessoas não sabem que não é necessário fazer reconstrução em cabelo natural, é um cabelo sem química, que tipo de pente e escova devem usar para desembaraçar o cabelo”, explica e acrescenta que no final de cada workshop fazem uma roda de conversa para debater alguns tabus.

A primeira sessão do workshop #pasaudibukabelu foi com um grupo de voluntariados do corpo de escuteiros na cidade da Praia, seguido de uma escola primária no interior da ilha de Santiago, onde se deparou com o caso de uma criança que sofre de fortes dores de cabeça por causa do cabelo apertado que a impede de assistir às aulas e por causa disso é castigada pela mãe e ainda sofre bullying por causa de uma doença que tem no couro cabeludo.

“Também levamos a formação para algumas empresas e instituições, como é o caso da Cadeia Central da Praia, da Enapor e fizemos um evento privado no Praia Shopping, com mulheres de outra classe social, com acesso à informação, mas que não sabem como utilizar os produtos de cabelo”, diz e revela que pretende realizar estes workshop uma vez por mês.

Para Mitza, a experiência na Cadeia Central da Praia foi a mais desafiante até ao momento. “Passámos uma tarde com as 22 reclusas, que na sua maioria foram vítimas de VBG e que acabaram por cometer uma fatalidade. (…) Ficaram contentes por nos receber e acabamos por desempenhar o papel de psicólogas, cabeleireiras, conselheiras e tentamos também desenvolver o lado do empreendedorismo. (…) Partilharam connosco as suas histórias de vida e muitas delas não tiveram uma vida fácil. Houve escassez de muita coisa, desde a questão afetiva aos bens materiais. (…) Foi uma experiência bastante enriquecedora na medida que as suas histórias de vida despertam em nós muitos sentimentos”, diz e salienta que a maioria das reclusas tem a autoestima baixa.

Apesar de ser um projeto de cariz social, a cabeleireira diz que tem tido muita procura por parte de empresas e devido à demanda pretende estender o workshop para as empresas e estabelecer um valor simbólico a ser pago.

Do escutismo para a vida

Mitza Alfama é escuteira desde os seis anos e sempre fez voluntariado. Atualmente, apesar de ter pouco tempo por causa do trabalho, não deixa de exercer o seu lado social. “O escutismo despertou em mim o lado social na minha vida pessoal e profissional. (…) Sempre fiz voluntariado e faz-me um bem enorme. Dentro da falta de tempo, arranjo sempre uma forma de fazer voluntariado porque sinto que é gratificante para mim e é bom para a imagem do meu negócio.”

Nasceu no Dia do Ambiente, é amiga da natureza e diz ter uma preocupação enorme com o lixo que gera no salão. “Temos vários produtos de plástico e todo o final do mês recolhemos os materiais e levamos na Ekonatura, uma empresa que recicla plástico e vidros e transforma-os em objetos decorativos e materiais para a construção civil. Publicámos a iniciativa nas redes sociais e foi um despertar para outras empresas”, diz alegremente.

Mitza também trabalha com as crianças do Centro de Emergência do Instituto Cabo-verdiano da Criança e do Adolescente (ICCA). Segundo a escuteira este é o serviço mais difícil que realizam no salão.

“É um serviço que fazemos desde o início, mas não divulgamos por causa da imagem das crianças e também porque é o serviço mais difícil que realizamos no salão. (…) São crianças que já passaram por algum tipo de trauma/abuso e têm um nível de afetividade baixo. (…) Houve um caso de uma criança com marcas de ferro quente na cabeça. Fiquei traumatizada (…). É um serviço pesado, mas não desistimos. Esse ano reativamos o protocolo com o ICCA. Uma vez por mês recebemos três crianças que tiveram bom comportamento. (…)É um trabalho que não é remunerado, não é fácil por causa de toda a parte emocional e psicológica que temos que estar preparadas, temos um série de regras para receber as crianças. No final é muito gratificante por causa da alegria delas”, diz emotiva.

Kuale Miniz, três anos a cuidar do cabelo natural

O salão Kuale Miniz existe há três anos no mercado praiense e, atualmente, emprega quatro pessoas. Segundo a fundadora o percurso tem sido bastante positivo, mas ao mesmo tempo desafiante. “É bastante positivo devido ao feedback que recebo. (…) É desafiante por causa de todos os traumas, insegurança, tabus e padrões que a sociedade tem. (…) No salão tentamos desmistificar tudo isso”, diz e realça que trabalhar com o público não tem sido fácil.

Mitza já apresentou o projeto em vários concelhos da ilha de Santiago, bem como no Fogo e fora do país, como é o caso dos Estados Unidos da América e Portugal.

A perspetiva futura é expandir a nível de tour, que é esporádico. (…) No que tange a ter um espaço físico não sabemos porque o maior desafio de Kuale Miniz desde o início até agora foram os recursos humanos. Ou seja, para ter um serviço é preciso ter mão de obra qualificada e esta é a parte mais desafiante, visto que, a nova geração tem outra perspetiva, não querem nada fixo”, diz e revela que no verão vai estar em Portugal, no âmbito do TourKM, que tem realizado a nível regional, nacional e internacional.

Em forma de conclusão, Mitza diz que o cabelo dos cabo-verdianos está bem tratado, mas alerta sobre a venda de produtos falsificados no país. “Os produtos originais em Cabo Verde são raros, ainda mais na cidade da Praia. Estão a entrar vários produtos falsificados no país e temos recebido inúmeras pessoas com queda capilar acentuada devido ao uso de cremes e gel falsificados, que estão a danificar o cabelo dos cabo-verdianos”, diz e chama a atenção do serviço das Alfândegas para estarem atentos a entrada de produtos cosméticos no arquipélago.

No que tange ao uso de produtos caseiros no cabelo, a cabeleireira aconselha a jogar pelo seguro e a usar apenas os produtos pré-concebidos para cada tipo de cabelo. “Do resto comam bem porque faz bem para o cabelo, unha e pele e o organismo agradece.”

Balai

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